domingo, 13 de junho de 2010

Fausto de Sanctis diz que lei brasileira favorece crime organizado

Responsável pela prisão e condenação de poderosos do quilate dos banqueiros Daniel Dantas e Edimar Cid Ferreira, o juiz federal Fausto Martins De Sanctis não usa meias palavras para criticar a Justiça brasileira.
Para ele, as leis em vigor no país hoje beneficiam o crime organizado. E faz um alerta: o projeto do novo código de processo penal discutido no Congresso “vai piorar o que já é ruim.”
Em Bauru, onde foi palestrante neste sábado do curso de “Capacitação e Treinamento no Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro”, promovido pela Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo, De Sanctis evitou o tom político adotado um dia antes por promotores, juízes e membros do Ministério do Justiça, que admitiram dificuldades para levar “criminosos do colarinho branco” à prisão, mas também ressaltaram avanços.
O juiz ponderou que houve um avanço em termos mundiais no combate ao crime organizado, o Brasil incluído, mas o país ainda tem leis tímidas para punir os criminosos poderosos.
“A legislação brasileira é tímida na questão do combate ao crime organizado, absolutamente desatualizada”, diz.
Para ele, que também condenou o empresário Ricardo Mansur e mandou prender o mega-investidor Naji Nahas e o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta, a falta de punições efetivas “é um reflexo do péssimo funcionamento do sistema Judiciário.”
“É uma legislação que contempla tudo o tipo e sorte de recursos e mecanismos de chicanas processuais que, ao meu ver, são vedadas, mas de certa forma tem sido aceitas pela jurisprudência. Por outro lado a jurisprudência é bastante flexível, é de uma variedade absoluta de forma que isso tem provocado toda a sorte de morosidade e não se consegue chegar ao trânsito e julgado”, explica.
Fausto de Sanctis também faz duras críticas ao novo código de processo penal, pronto para ser votado no Congresso.
“O processo brasileiro precisa ser repensado, mas não com esse projeto que está no Congresso Nacional que vai piorar o que já é ruim. O Brasil precisa definir se realmente quer um processo penal eficaz ou quer simplesmente ficar enaltecendo parte de princípios constitucionais e deixando outros descobertos, como a segurança pública”, ataca.
O magistrado da 6º Vara Federal de São Paulo não quis comentar a polêmica envolvendo Daniel Dantas. Em 2008, o juiz prendeu o banqueiro duas vezes – uma após ele ser solto horas antes pelo então presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes – e o condenou a dez anos de prisão por corrupção ativa e tentativa de suborno a um delegado federal. Dantas recorre em liberdade.
“Eu não comento fato concreto. Desculpe, mas eu não gostaria de falar sobre esse fato”, disse, ao ser questionado se acredita que um dia o ex-dono do banco Opportunity poderá efetivamente cumprir pena na prisão.
Sobre a declaração do ministro do STF Joaquim Barbosa, que em uma discussão acusou Gilmar Mendes, desafeto de De Santis, de “destruir a credibilidade da Justiça”, o juiz foi ponderado.
“A população é sabia e sente as instituições. Engana-se quem acha que a população não tem o conhecimento adequado do que está ocorrendo. A ineficácia do nosso sistema é reconhecido pelo mundo.”
le cita como exemplo negativo o relatório preliminar do Gafi (Grupo de Ação Financeira) – organismo de natureza intergovernamental e multidisciplinar criado com a finalidade de desenvolver uma estratégia global de prevenção e de combate à corrupção – que criticou a Justiça brasileira.
“O sistema judicial brasileiro é uma vergonha para o país. O relatório mostra que o país, de fato, no combate ao crime organizado e à lavagem de dinheiro, é ausente, quando não nulo. Mas espero que o país possa realmente trilhar o rumo correto e não ficar enaltecendo teses acadêmicas que na realidade não servem a nada a não ser destruir com o pouco que funciona”, fala.
De Sanctis também é ponderado ao comentar o fato de ter virado celebridade junto à população. O juiz tem até um site de apoio na rede mundial de computadores (apoiamosfaustodesanctis.blogspot.com). Ele também foi homenageado por diversas instituições pelo país logo após a prisão de Dantas.
“Eu tenho que ver com calma e distância [a popularidade] porque eu não posso me influenciar nas minhas decisões por esse tipo de manifestação, mas é muito gratificante saber que elas existem e muito estimulador também.”
Já se tem alguma intenção de disputar um cargo político, como vai fazer nas eleições de outubro o delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz, responsável pela Operação Satiagraha – que culminou com as prisões promovidas por De Sanctis –, afirma que “de forma alguma”. “Nunca agi pensando nisso e não quero ser político.”

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